sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Os Homens Já Mortos da Minha Vida - E sua relação com a Sociedade

Karl Marx foi o grande ídolo da minha adolescência até eu conhecer três caras que mudaram minha visão de sociedade. Eu achava que o comunismo e o socialismo eram a solução para tudo, que agricultura de subsistência daria certo e que ninguém precisa de dinheiro pra sobreviver. Tentei até ostentar um sovaco cabeludo na época, mas meu senso de higiene falou mais alto.

Marx é utópico. A sociedade precisa aprender a viver em sociedade antes de ser livre. É por isso que a Justiça se faz tão necessária. Como a Paulinha me explicou, existem quatro verdades: a verdade do réu, a verdade do juíz, a verdade da vítima e como tudo aconteceu de verdade - o que só os envolvidos sabem. Nós temos nossos segredos e, principalmente, nossas limitações, por isso é impossível acreditar que se fosse tudo livre, não teríamos abusadinhos - mesmo que fosse ensinado aos cabeças de bagre desde criança que aquilo era errado, eles ainda fariam justamente por ser errado. A sociedade é feita de regras que são quebradas por idiotas o tempo inteiro, num grande paradoxo, se você quebra as regras você é melhor que o outro. Vai entender...

Quando li "Admirável Mundo Novo" tudo que eu imaginava sobre sociedade foi pro saco. Estamos caminhando pra opressão televisiva (e cibernética também, não negue) enquanto livros, conhecimento prático, o bom e velho "mão na massa" ficam com as mazelas menos favorecidas. Eu tenho a leve impressão, às vezes, que a Nova Classe Média só lê o que está escrito na wikipédia e de lá vem todo seu conhecimento a respeito de autores renomados que são comentados na Baixa Augusta... Eu espero que seja só impressão minha, sinceramente, porque aceitar que o mundo vai mais e mais pro condicionamento humano do que para o conhecimento pleno me tira todas as esperanças... Enfim, foi o primeiro cara que me mostrou umas verdades me dando tapas na cara, uma coisa meio "olha como a televisão de idiotiza, vai, fica presa nela, daqui a pouco vão te dar pílulas e você só vai conseguir usar e ver televisão e será sua FAMÍLIA, a única coisa que você adorará enquanto não consegue sentir nada pelas pessoas, enquanto não se apega a ninguém e vive numa ilusão onde a realidade é muito mais cruel: você vai estar sempre sozinha". Caiu a ficha, sabe? Não que a televisão seja a culpada de todas as coisas ruins do mundo, não é, mas ela te dá apenas um lado da moeda, é parcial e pragmática. Não acredito também no romantismo oculto nisso tudo, que é justamente a busca pelo conhecimento, mas acredito que se você mexe a bunda do sofá e vai fazer alguma coisa de útil de verdade, você já tem um conhecimento mais elevado do que da maioria das pessoas ao seu redor.

Aí li Machado de Assis. Eu já havia lido e resolvi ler de novo, sem aquela obrigação de interpretar capítulo por capítulo como a apostila da escola pedia. "Não, agora eu posso devorar o livro e é o que eu vou fazer". Se você quer saber, Machadão é um dos meus caras mortos favoritos. Tudo o que ele mostra pra você é o que se consegue ver quando olha-se em volta. Você vê as pessoas ricas, as pobres, as submissas, as traídas, as infelizes, as amarguradas, as decepcionadas e ao mesmo tempo você consegue ver como a sociedade - principalmente a nossa - é aristocrata e mesquinha, vil e desconfiada. Não vou entrar nem no mérito sobre o pai do bastardinho ou da frieza da Capitu, não é isso em jogo nesse momento, mas sim no idealismo oculto do próprio Casmurro, em como ele via o mundo de uma maneira única. Quantas vezes você parou para olhar pela sua janela e realmente olhar?

Aí conheci meu grande e querido Nabokov. Tinha uns 19 anos quando li Lolita e não achei tudo isso, até ler Glória. É INCRÍVEL. Fica na minha lista de leitura essencial, porque mostra todo o romantismo e ao mesmo tempo toda a crueldade que existe no conceito de "liberdade" que a gente aprende por aí. Glória tem o casal romântico, tem as brigas, tem as disputas por atenção mas tem, acima de tudo, uma naturalidade que faz com que você queira ser Martin e queira estar em Zoorland, porque você sabe que aquele mundo é o ideal... E aí você olha pra dentro de si e percebe que na verdade esse mundo ideal é seu, é você quem faz. A sociedade pode se deteriorar o quanto quiser que você ainda estará porque é forte, porque pode, porque quer e porque buscou isso...

No final, todos eles buscam um ideal. O que é um ser humano sem um ideal? O que você faria sem um objetivo sequer? Qual o problema de ser diferente, de pensar diferente, de não acreditar em instituições pré estabelecidas? Você precisa mesmo ser igual aos outros? Você já se fez alguma dessas perguntas?

2 comentários:

Amanda Guerra disse...

Eu entrei no seu blog outro dia, mas não tive tempo de olhar bem. Achei que parecia legal e voltei hoje... estava lendo tudo, curtindo essa maneira de escrever leve e espontânea quando vi um texto ali atrás: Para mim e para eles. Ou algo assim.

Achei que seria injusto ir embora sem deixar um comentário...

Enfim, quantos aos homens mortos da minha vida, eu citaria especialmente Saussure, pois "criou" o que eu escolhi fazer da vida, Machado (tb!) pois me mostrou que os livros obrigatórios da escola podem ser bacanas e acabou me dando a oportunidade de ler várias outras coisas e Renato Russo, sem o qual minha adolescência não teria sido a mesma.

Gostei da sua lista e estou pensando em ler Glória... =D

Abraços! o/

Anônimo disse...

Esplêndido! Ótimo texto. Serve de vacina, de paliativo e até como remédio.
Pesado em conteúdo, mas suave pra quem já leu tudo isso citado, e pôde acompanhar o raciocínio.
Me abstenho de comentar sobre os "homens" me atendo à sociedade:
Nenhuma mudança importante aconteceu enquanto eu lia Admirável Mundo Novo, mas foi um divisor de águas que mudou a sociedade, pelo menos em minha forma de concepção. Logo, mudou a sociedade. Mudou UM na sociedade. Aquele dia.

Mas no fundo, nada disso faz muita diferença à longo prazo. A humanidade não será extinta, os idosos vão notar uma queda na "qualidade de vida" mas quem já for nascendo no caos vai tomar esse estado como referência de "normal".
"E disso sairão admiráveis adaptações, das quais aqui o meio é dado.*" (by J.Benjor - Hermes Trismegisto e sua celeste tábua de esmeralda)

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